sexta-feira, 2 de abril de 2010

O tempo em tempos de GPS!

Relógio de Sol-Imagem da Web


Sua invenção deve ter sido obra de algum ingênuo que não tinha nada para fazer daquela vidinha pré-histórica enfadonha e , ao invés de ir caçar ou plantar batatas, resolveu ficar observando o sol e a sombra de algum maldito arbusto e acabou levando à invenção desta bomba de efeito imoral chamada tempo e que foi materializada muitos séculos mais tarde pela máquina trucidante batizada como "relógio". A palavra é originária do grego "horológion",hora( horas)+ lego(dizer), ou seja, dizer a hora.

Observar o céu, as estrelas e o Sol acabou mexendo com o juízo de nossos ancestrais a ponto de ligarem a chama sob os pés das próximas gerações que um dia iriam tornar-se escravas do ponteiro que tenta aprisionar este deus chamado tempo.

O relógio solar reinou por séculos e, apesar da sua imprecisão, fazia sucesso, até porque os viventes há cinco mil anos atrás tinham um ritmo bem domingueiro.

Esta abstração, melhor dizendo, aberração sacramentou as perseguições cruéis que o tempo exerce sobre os terráqueos, discípulos de Crono, posto que a Terra, por fazer aquele movimento básico em torno do seu eixo acabou virando um despótico relógio.

Do relógio solar, passando pela ampulheta e até os mais belos modelos exclusivos lindos e maravilhosos carregados nos pulsos, todos exercem a cruenta missão de atormentar os indivíduos.

A passagem pela existência terrestre obriga o desinfeliz a fazer aniversário, numa contagem regressiva abominável que só acaba quando ele dá o último suspiro. Em cada novo aniversário o certo é que você já perdeu e ainda não chegou. É o momento do nunca. Você quer fazer dez, quinze, dezoito, vinte e cinco, vinte e cinco , vinte e cinco e descobre que tem que fazer trinta e cinco e quarenta e cinco e cinquenta e todas as outras cifras. Isto se tiver sorte! Ah e , é claro, nunca vai dar tempo de entender como os aniversários são cada vez mais rápidos, em intervalos cada vez menores. Não dá tempo para conquistar o mundo. Tóch! Tóch!

Todos os protocolos, brilhos e formas de abordagem da vida acabam sendo cronometrados e dimensionados para virar história. Ninguém venha me dizer que esta não é uma face tétrica do existir.

Ele, o instrumento que mede a passagem do tempo, se encarrega de avisar que você nunca vai correr o bastante, que por mais que você organize sua agenda, vai ter que esquecer alguns compromissos , desmarcar um almoço, cancelar o dentista que ficou marcado para o final da tarde. Você vai correr atrás dele como um cão atrás do rabo e ainda vai descobrir que algo que poderia ser feito em trinta segundos como abotoar cinco botões pode levar quatro minutos. Que quando você está atrasado os ponteiros vão saltar de dois em dois minutos e não vai adiantar deixar o batom e o brinco. Você vai se atrasar.

O telefone vai tocar , você vai perder suas chaves na própria bolsa, o cachorro vai se enfiar debaixo de algum móvel ou ainda vai sumir a roupa que você estava planejando vestir. Então a pequena seta vai engolir os números rapidamente.Todos os ítens vão conspirar. O semáforo vai estar fechado em cada esquina e, com certeza, se depender de táxi ou ônibus, não vai achar nenhum.

Enfim, eles podem ser lindos, tradicionais, descolados, fashions, coloridos , aristocráticos, solenes , brilhantes, imensos, discretos, com números, digitais, não se iluda, é apenas uma casca, uma camuflagem para esconder toda a sordidez oculta neste instrumento chamado relógio.

"Amaldiçoem os deuses o homem que descobriu como diferenciar as horas; também aquele que neste lugar pôs o relógio do sol que repartiu os meus dias em bocadinhos". (Autor desconhecido)

Este camarada sabia o que estava falando.Os inventores do relógio não sabiam nem ler e nem escrever e acabaram se aferrando a estes simpáticos e requintados torturadores.

O fato é que absolutos e sutis, estes detratores tornaram-se parte de você, estão na sua corrente sanguínea.

Didaticamente fizeram você compreender que a culpa é sempre sua. Eles riem da sua cara cada vez que olha para eles e nao entende como aquele maldito ponteiro foi parar lá, como o calendário perdeu folhas com tanta rapidez, como o espelho está apressado!!

Eles são uma liga de sádicos, mancomunados para enlouquecer os responsáveis de todo gênero.

Lembra como ficou fascinado quando ganhou aquele primeiro reloginho de faz de conta ou quando desenhava com caneta o relógio no pulso. Era tão colorido e você brincava de ver as horas, ingenuamente, sem saber que seria o começo do thriller de horror que faria as historinhas da bruxa malvada parecerem fichinha.

Quando o ponteiro grande estiver no doze e o pequeno estiver no oito você estara se danando.

O elevador só sobe, não volta, percebeu?Contagem regressiva! Não adianta correr para o oeste de Greenwich! A ampulheta esta virada!!

Em tempos de GPS!!!
beijo acelerado
da melind@

domingo, 28 de março de 2010

universos paralelos...


Um carro rompia a avenida vazia na madrugada e aquele dia não estava em nenhum calendário. Nem sequer poderia ser chamado dia. Um vento particular preenchia todos os espaços e o movimento era familiar. A rua longa com canteiros arborizados parecia ser a mesma onde crescera e vira crescer. Nada fora do lugar.

As luzes se apagaram. Escuridão. Fecha e abre a cortina. Mudou o cenário e tintas escuras tingiram as árvores dançantes e inquietas . O vento era uma marca registrada ali. Quase sempre dirigia a coreografia das folhas, dos papéis e de qualquer coisa que se aventurasse a atravessar seu caminho.

Uma certa apreeensão murmurou aos ouvidos dela.

Não havia nada de errado, apenas havia chegado em casa e tudo estava como sempre esteve. Emborcou o carro e entrou. Quando desceu sentiu o vento equivocado lá dentro, como se fosse um anfitrião naquela noite estranha. Não lembrava de onde estivera e nem porque chegara tão tarde. Havia perdido a noção do tempo. Apenas era tarde o bastante para que nada além do vento se movesse. Lembrou dos westerns e das cidades fantasmas hollywoodianas.

O ar era excessivamente fresco e um certo prenúncio se movia por dentro dela.

Começou a andar pela casa que não identificava. Um lugar que subira vários andares, mas não eram andares no sentido comum. Eram andares, movimentos súbitos da alma. Caminhos.

Estava acessando cômodos secretos, adormecidos e não era culpa do acaso.

Seguiu pelo espaço como se estivesse a procura de um encontro. O lugar esperava por ela morno e intenso. Era uma rota nova.

Parecia um apartamento apenas pelo fato de estar longe do chão. Lembrava um daqueles lofts americanos. Um lugar novo em um espaço antigo. Se aproximava disso. Ela já estava no coração da "casa". Talvez por isso o vento estivesse tão forte.

Ela correu aos dormitórios com a ânsia da saudade. Entrando em seus próprios compartimentos interiores. Locais que não visitava há muito tempo.Tão íntimos e pessoais. Tinham a cor dela . Eram suaves como um veludo cor da pele.

Ninguém a vista, como um remake feliz do fim do mundo, onde se é o único sobrevivente.

O espaço enorme crescia a medida que ela se movia dentro dele. Sua expectativa tornava-se maior a cada cômodo. Estava em um sonho. Mais uma jogada estratégica da mente.

Estava dentro dela mesma percorrendo seus espaços na penumbra atraente e aconchegante. Lembrou um colo de mãe. O vento dançava entre cabelos e idéias restaurando sua clareza. Algo afinava com os sentidos. Ela estava inteira.

Uma dose de euforia a engoliu. Continuou a deslizar pela intimidade dos compartimentos livres.

Uma etiqueta estava presa a uma caminha de criança. Eram dois símbolos quadrados que se enchiam de rosa. Foram ficando nebulosos até desaparecer. Um espaço censurado pelas horas que passavam e iam apagando da memória da narradora os registros embaçados, como um vapor que vai tomando suavemente o espelho até encobrir tudo.

Ventosidade fugaz daqueles instantes. Não calava. As folhagens conversavam encobrindo as imensas janelas , abocanhando todos os quadrantes. Estava ali onde tudo começava e terminava.

O teto baixo e a luz serena ameaçavam a racionalidade e por um momento olhou numa das camas, alguém encoberto pelo sono.

Ao puxar as cobertas lá estava ela e mais ninguém.

Um sino tilintou partindo o ar , segredando a parte oculta . Ela. Estava vasculhando os subúrbios da mente.
Havia portas para romper e espaços imensos para conhecer. Nem começar , nem terminar naquela dimensão de coisas. Aquele interstício de razão foi misturado com o toque agudo de metais.

O que experimentava era amenidade, sem seus títeres do mundo "real". Paz.

Uma partícula da sua antimatéria, uma mistura de silêncios gritões preenchia todos os lapsos.

Universos paralelos, concomitantes, sincronizados , autoexplicativos.
Havia uma bruma de cores suaves e ternas presentes em todos os tempos da vida dela . Ali , num ponto único, o paradoxo do tempo paralelo que acontecia dentro e fora dela se consumava. O sono velava seu despertar. Encontrou seu proprio deserto. Sua cidade fantasma devastada por lembranças. Sem sustos, como deve ser.

Um beijo multidimensional

    Fio  Entrei no absoluto e simples vagar do tempo. Invadi os espaços aparentes que reservei para um dia. Olhei minha própria fa...