sábado, 23 de outubro de 2010

Gavetas abertas: pequenos indícios da verdade de Jung..

Foi em uma destas noites com sol que o Flávio Venturini costumava cantar que ela deu por si, ou por uma destas multidões dela mesma que encontrara pela vida. Talvez o assunto que a levara ao ponto em questão fosse sim o amor.

O lugar poderia ser uma das ruas que cruzam a principal na praia de Cabeçudas em Balneário Camboriú, a rua subia de forma cada vez mais íngreme, como se quisesse fazer tudo escorregar para o mesmo ralo da praia. Não era possível ver o início nem o fim da rua que subia, mas ali estava o sobrado cheio de luz muito branca. Era uma construção quadrada sem muitos detalhes. Só havia metal e aquele branco translúcido, aliás um branco lúcido e revelador.

Em seu interior revelavam-se as memórias. A sensação era de descoberta. Passou a eternidade de um dia naquele instante em que se discutiam os sonhos. Cloncluíra estar dentro de um , no fundo de uma gaveta onde encontrara uma verdade insólita.

Havia um momento de partida da consciência. Havia uma distância da consciência que se podia atingir. A partir dali, daquele tempo e daquela distância, o cronômetro interno iniciava a contagem regressiva. Como se o ralo começasse sugar de volta.

Se não retornasse daquele ponto perderia-se daquele ponto para sempre. Não poderia mais retornar àquela existência, ainda que fosse só um sonho.
Estranhamente estava ali o pai, que encontrara pela última vez em um leito de hospital minutos antes da última parada cardíaca . Estava muito a vontade e contribuía com a conversa silenciosa que acontecia entre os pensamentos. Tentou dissuadí-lo a mudar. Quis entender porque ele desistiu de ser aquele que ela idealizou ou que acreditou que fosse. Quis saber porque se abandonou ao tempo. Por que havia envelhecido?

Passou um dia de sol frequentando pedaços de memórias que se perderam uma após outra.

Dividiu-se entre o som dos sonhos e os sons da vida que se desenhava em outra manhã de Sábado.

Chamou a mãe para acompanhá-la e começou a descer a rua. Sentiu que estava chorando e continuou descendo a rua sem ver seu final. Havia um momento de partida. Havia uma distância da consciência que poderia atingir. Olhou para trás e não havia mais ninguém. Deixou suas memórias naquele endereço branco e brilhante da rua perpendicular. Fechou a gaveta com sua descoberta e despertou.

Ao fechar a gaveta ainda estava repleta das sensações doloridas que trouxera do epicentro de suas multidões.

Um caneta, precisava de uma caneta. As cores foram escoando para aquele ralo de tempo. As verdades foram ficando embaçadas até restar a leitura fria das lembranças, exceto pelas lágrimas e pelo frêmito de tocá-las, tão reais ..


Beijo atemporal

da melind@

    Fio  Entrei no absoluto e simples vagar do tempo. Invadi os espaços aparentes que reservei para um dia. Olhei minha própria fa...