segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Segunda com gosto de sexta......

Quando eu era criança a véspera do feriado de navegantes era uma imensa aventura. Primeiro porque tinha minha turma de brincar e ir a praia faturar umas bugigangas celestiais. Nosso chalé ficava a três quadras da praia. Éramos uma turma de garotas e garotos fissurados entre a fantasia, a sacanagem e a curiosidade quase mórbida. Mas o ápice mesmo era quando minha mãe nos deixava ir com ela espiar aquelas pessoas estranhas de branco rodopiando na beira da praia. Era absoluto. É bem verdade que foram raros momentos , mas inesquecíveis e saborosos.
Aquelas pessoas eram comuns e chegavam em excursões, trailers,ônibus e carros de toda parte. Não havia muitas festas como aquela .Mas ali, vestidos com aqueles trajes brancos e esvoaçantes, se tornavam especiais. Eram as atrações da noite. Eram eles que roubavam a cena.Fumavam seus charutos e cachimbos e baforavam poderosamente. A música propiciava um clima de ritual macabro . E eu , que tinha uma imaginação psicopata e adorava galerias de terror, aproveitava para turbinar minha expectativa até perder definitivamente o sono. As barracas iluminadas por lampiões e até algumas fogueiras abrigavam gente de todas as idades, até crianças. Aquelas pessoas guardavam status de autoridades.
A nossa turminha aproveitava para encontrar casas de veraneio fechadas e reunir-se para contar histórias de horror. Tudo no clima.
No dia seguinte era acordar muito cedo e sair em expedição para praia. Se tivessemos sorte poderíamos achar um daqueles barquinhos de madeira repletos de pentes, espelhos, colônias baratas , sabonetes e toda sorte de presentes que as pessoas entregavam à santa. Os badulacos eram divididos como o saldo de uma caça ao tesouro. Eram preciosidades que carregávamos em nossas monaretas, como heróis que retornam de uma difícil expedição e mostram seus troféus. Eu adorava os talcos fedorentos e as colônias de rosas. Naquela época eram poucas as tendas e era preciso ficar até muito tarde e ir muito, muito longe pela praia , para poder encontrá-las. Em compensação para arrebatar os presentes era só uma questão de chegar primeiro.
Quando minha mãe ia espiar a "festa", junto com minhas tias, era necessário ir bem longe para encontrar as tendas consideradas mais poderosas. Contrário senso, a idéia era manter uma certa privacidade para fazer seus rituais e homenagens. Hoje é de uma popularidade etílica chocante. Acho que se tornou mais um feriado, um motivo para diversão. A atmosfera perdeu-se em algum dia , mas os tambores ainda rufam na madrugada, sejam das tendas da praia, sejam dos pagodeiros de plantão, que não perdem a oportunidade de puxar uma cantarolice enjoada.
Hoje são milhares de pessoas que se deslocam para a já superlotada praia, marcada por intenso policiamento e sinalização. São barraquinhas e centenas de vendedores ambulantes sob a escuridão entrecortada pelos faróis de carros curiosos que circulam como baratas tontas pela noite.
Enfim, ficamos combinados assim, num momento de nostalgia.
Escutando Hotel Califórnia e comendo o terceiro alfajor, e olha que eu nem gosto muito de alfajores. As opções são tantas que eu optei por deixá-las de lado. Me optei! Fim de tarde e o calor foi atropelado por uma chuvinha pra lá de bem vinda. O Stuart ganhou um osso de couro de boi e está completamente absorto em sua tarefa de dilacerá-lo por completo. A semana já começa terminando com um feriado. O que torna a segunda-feira um sexta. Isto seria o êxtase se aqui em Bigrivertown não estivesse um clima de "este lugar é pequeno demais para nós todos" ou " eu sei o que você fez no verão passado". Sim eu sei. Sujeira na praia , barulho, muita cerveja e ...a verdade é que temos que dividir o planeta com todo gênero de criaturas. Não estou sendo arrogante, apenas realista. Se eu pudesse optar frequentaria lugares onde não existisse esse tipo de ocorrência que eu confesso que me aborrece. É , eu até me aborreço de vez em quando. Me aborreço um pouquinho, é verdade. Ninguém me aborrece como eu. Não é soberba.
O fato é que eu não vou passar a semana na praia . Não vou. Não quero dividir a praia e pronto. Prefiro deixá-la para o democrático mundo dos não aborrecidos.
Quando imagino chegar na praia e encontrar algumas centenas de seres por metro quadrado, fazendo seus churrasquinhos regados a cerveja e animados pelo pagodão. Fico em cólicas. Sempre pode ficar pior quando pinta aquele futebol de marmanjos ( que só estão sacudindo a pança) ou ainda quando rola aquele Cd do Calypso pra quebrar um pouco o funkão degenerado ou o axé insuportável. Enfim, ainda preciso ficar feliz porque não tocou nenhum sertanejo ou gospel. O fato é que eu acho que a lei de Murphy está aí e não dá para oferecer oportunidade para o acaso.
beijo claustrofóbico da melinda

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